Euripedes Carvalho
Finados são aqueles que já se foram desta para outra vida, que já partiram deste mundo para as várias dimensões espirituais que circundam a Terra.
A atitude do espírita para com esse dia e para com aqueles que o cultuam com sinceridade de propósitos, deve ser sempre a de respeito e compreensão, entendendo que essa é a forma pela qual tradicionalmente homenageiam os seus mortos.
Nas questões 320 e 321 de O Livro dos Espíritos, os Luminares da Codificação nos esclarecem que: “Os Espíritos, quando lembrados por seus entes queridos que ainda vivem na Terra, sentem aumentar sua felicidade quando são felizes; e os infelizes são envolvidos por grande alívio.” E na questão 323, acrescentam: “A visita ao túmulo é uma maneira de manifestar que se pensa no Espírito ausente: é a exteriorização desse fato. Eu já vos disse que é a prece que santifica o ato de lembrar, pouco importa o lugar, se a lembrança é ditada pelo coração.”
Mais adiante, na questão 329, quando Kardec indaga se o respeito instintivo do homem pelos mortos em todos os tempos e entre todos os povos é um efeito da existência futura, obtém a resposta que se segue: “É a sua conseqüência natural. Sem ela, esse respeito não teria sentido.”
Vê-se, pois, que o respeito que se manifesta pelos mortos, especialmente neste dia, não resulta do hábito, da tradição, mas, principalmente, de um dever de fraternidade que a memória afetiva retém e da crença intuitiva na vida futura. A origem dessa tradição católica remonta ao século II, quando os primeiros cristãos rezavam pelos falecidos, visitando os túmulos dos mártires. Já no século V, a Igreja costumava dedicar um dia do ano para rezar por aqueles mortos, dos quais ninguém mais lembrava ou rezava por eles. É, porém, no século XI, que a prática adquire um caráter obrigatório, quando nos pontificados de Silvestre II, João XVII e Leão IX, estabeleceu-se que a comunidade católica deveria dedicar um dia do ano aos seus mortos. Somente no século XIII, todavia, é que o Dia de Finados passa a ser oficialmente comemorado em 2 de novembro, pois o dia 1º já era dedicado à Festa de Todos os Santos.
Embora concordando com o fundo – o culto aos falecidos -, a Doutrina Espírita discorda em relação à forma: a visita aos cemitérios, com dia e hora estabelecidos. Os túmulos, os jazigos, as lápides, dos mais simples aos mais suntuosos mausoléus, apenas abrigam, por certo tempo, os chamados “restos mortais”. Os Espíritos, seres inteligentes que usaram aqueles corpos ali depositados, deles já se desvincularam, voltando ao seu mundo de origem. “Eles não morreram. Ainda quando não reconheças de pronto, semelhante verdade, eles te vêem e te escutam! (…) Entraram em novas dimensões de existência, mas prosseguem de coração vinculado ao teu coração.” (Emmanuel/Chico Xavier, Caminhos de volta).
Quando o Espírito encarna, ele toma emprestados elementos da natureza que irão compor sua vestimenta física, substâncias essas encontradas nos demais reinos. O fluido vital, nessa união e ordem, espírito, perispírito e matéria, dá vida à matéria, organizando a vestimenta celular e permitindo, ao espírito encarnado, determinado tempo de vida neste mundo. A morte natural se dá pelo desgaste inevitável da matéria organizada, no correr dos anos de existência. Os órgãos, neste caso, se esgotam, não conseguindo mais reter o fluido vital – combustível essencial da vida material –, ocorrendo, então, o desenlace.
Morre o corpo, o espírito desencarna. (Tu és pó e ao pó retornarás). O Espírito, junto ao seu corpo perispiritual, segue livre a sua jornada. Os elementos que compunham aquele corpo passam pelo inevitável processo da Lei de Destruição, voltando também, em obediência a uma mecânica divina, à sua origem, onde, logo, irão recompor novos corpos.
Esse extraordinário fenômeno da natureza confirma o sábio conceito de Lavoisier: “Neste mundo nada se cria, nada se perde, tudo se transforma.”
Cientes dessa realidade, não mais há razão que justifique o culto aos mortos, por essa ritual visita aos cemitérios. Tudo leva a crer que, no futuro, os próprios cemitérios passarão por necessárias transformações, ou, até mesmo, poderão deixar de existir. Nesta hipótese, a cremação pode apresentar-se como uma das alternativas, embora alguns inconvenientes ainda a serem superados.
De tudo o que aqui se disse, o mais importante é entender que: “A morte é orgânica, mas a libertação é de ordem espiritual”, processo pelo qual a própria vida se renova.