João Batista Vaz
Espírito livre do corpo físico, percepções aumentadas. Perguntados se a alma, uma vez no mundo espiritual, conserva as percepções que tinha enquanto encarnada, os Luminares da Codificação, na questão 237 de O Livro dos Espíritos, responderam afirmativamente, informando, ainda, que outras lhe são acrescentadas, posto que seu corpo era como um véu que as obscurecia.
Se, uma vez no mundo espiritual, o poder de perceber do indivíduo é aumentado em todos os sentidos, o é também quanto ao sofrimento. Avancemos para a questão 973 do LE e veremos que ela particulariza, entre as percepções do Espírito, a do sofrimento, visto que, mesmo o mais penoso desconforto imposto por uma aflição, uma dor, ao espírito encarnado, longe está de se igualar ao do Espírito desencarnado.
Sofrer é próprio do homem ou do espírito que não se depurou, razão de habitar um planeta de expiação e de carregar consigo o arquivo psíquico de débitos a serem resgatados. Vê-se que, quanto maior a maldade de alguém, maior é seu sofrimento, conquanto saibamos que nos são concedidas misericordiosas oportunidades reencarnacionais para tornarmo-nos bons e alcançarmos o bem-estar de espírito por meio de reparadoras ações caridosas. O que nos ocorre, todavia, é que descuidamos dos compromissos conscientemente assumidos.
Se o bom Espírito se premia, felicitando-se no plano que lhe é próprio, o mau se faz infeliz e sofredor. À pergunta “quais são os maiores sofrimentos que podem suportar os maus Espíritos”, os Mentores de Kardec respondem: “Não há descrição possível das torturas morais que são a punição de certos crimes. Mesmo os que as experimentam teriam dificuldade em vos dar uma ideia delas. Mas, seguramente, a mais horrível é o pensamento de serem condenados para sempre.”
O Codificador, a propósito, opina: “O homem faz das penas e dos gozos da alma depois da morte uma ideia mais ou menos elevada, segundo o estado de sua inteligência. Quanto mais ele se desenvolve, mais essa ideia se depura e se liberta da matéria. Ele compreende as coisas sob um ponto de vista mais racional e deixa de prender à letra as imagens de uma linguagem figurada.”
Vê-se que a Doutrina Espírita impõe-se não pelo dogmatismo, mas pelo convencimento racional. Por substanciar a ideia de razão e fé. Demais, quando lemos em Léon Denis “O Espiritismo não é a religião do futuro, mas o futuro das religiões”, estamos ouvindo afirmação, segundo a qual, se todas as religiões se assentassem na realidade das leis da Natureza, que são as imutáveis leis de Deus, estariam todas suficientemente sólidas para ganhar o futuro.
Daí, a importância do entendimento de que é graças ao Espiritismo que o homem pode conscientizar-se de como será o seu “depois da morte física”. Kardec, em comentário à questão do LE supra citada, referindo-se à capacidade de entendimento do homem, diz que “quanto mais ele se desenvolve, mais essa ideia se depura e se liberta da matéria. Ele compreende as coisas sob um ponto de vista mais racional e deixa de prender à letra as imagens de uma linguagem figurada. A razão mais esclarecida, ensinando-nos que a alma é um ser todo espiritual, nos diz, por isso mesmo, que ela não pode ser afetada pelas impressões que não agem senão sobre a matéria.”
É a própria Doutrina que nos convence de que são as comunicações dos Espíritos desencarnados, que nos chegam como chuvas de estrelas clareando-nos o entendimento, que nos familiarizam com as condições gerais e individuais da vida espiritual. “Tais comunicações – diz, ainda, Kardec – “no-las mostram ao mesmo tempo como consequência perfeitamente lógica da vida terrestre, e, ainda, que liberto do aparelho fantástico criado pela imaginação dos homens, elas não são menos penosas para aqueles que fizeram mau uso de suas faculdades.” (…) “É assim que uns o são pela visão incessante do mal que fizeram, outros pelos desgostos, pelo medo, pela vergonha, pela dúvida, pelo isolamento, pelas trevas, pela separação dos seres que lhes são caros, etc.”
Eis as consequências da maneira como nos conduzimos na misericordiosa oportunidade da existência física.