A Reencarnação Causaria a Perda da Personalidade?

 Dr. Ricardo Di Bernardi

 

Não menos frequentemente que as demais objeções, a questão da perda da personalidade nos é apresentada como uma justificativa que tenta pôr em xeque a lógica da filosofia reencarnacionista. Vejamos como são expostos os raciocínios a este respeito:

Veja, hoje sou um mulato brasileiro, de estatura média, residente em Recife, adepto da religião católica, falando português sendo professor de Geografia, como poderia “ser outra pessoa”, há 70 anos, vivendo nas praias do mediterrâneo, falando grego, com outra compleição física, ligado à navegação, adepto de outra religião, enfim, sendo outra personalidade tão distinta da atual?

E após a morte, quem eu serei: “ele”, o grego, ou “eu” o brasileiro?

Alguns ainda acrescentam, com uma ponta de ironia que esconde um iceberg de profunda desinformação:

“Será que eu fui Julio César ou Napoleão Bonaparte?”

Embora tais questões sejam extremamente simples para os estudiosos da reencarnação, não há por que nos subtrair ao dever de atender aqueles que, com toda justiça, desejam argumentos sólidos e claros sobre esta questão.

O corpo biológico está para o espírito, assim como a indumentária está para o corpo físico. O fato de trocarmos o macacão do trabalho pela fatiota dominical, não nos torna outra pessoa. Embora estejamos assumindo externamente outra aparência, com reflexos em nosso psiquismo, não deixaremos de ser o mesmo homem. É necessário, inclusive, que tenhamos a experiência e a oportunidade de aprender a usar diferentes indumentárias nos momentos adequados.

Na mesma encarnação ou experiência física, temos o exemplo da mudança constante e progressiva da personalidade.

Dificilmente alguém poderá considerar que não mudou, substancialmente, nos últimos 10 ou 20 anos em sua vida. Não nos referimos ao envelhecimento físico, mas à maneira coerente e profunda de encarar a vida e observar ao seu derredor. Normalmente, somamos experiências que amealhamos nos embates da vida.

A experiência adquirida modifica a personalidade, desenvolvendo a prudência nas atitudes e melhor adequando os indivíduos às adversidades do meio que o cerca. Não passamos, portanto, a ser outra individualidade.

Tal qual artistas que se trasvestem em personagens diversos, mas que continuam sendo a mesma pessoa somos um ser em trânsito, que arregimenta e vivencia várias experiências completando  as páginas de sua vida, escrevendo de punho próprio o livro de sua existência. A cada capítulo teremos um novo aprendizado em escala crescente, rumo ao epílogo da conscientização plena e sabedoria infinita.

Nos renascimentos sucessivos se estabelece uma linha clara e contínua do desenvolvimento da individualidade, em personalidades que se completam. Não há como determinarmos a ligação de nossa pessoa com Júlio César ou Napoleão Bonaparte. É possível cogitarmos, teoricamente, a admissão de que ambos possam ser o mesmo espírito, ou seja, o mesmo ator em diferentes personagens no teatro da vida.

Dizem alguns amigos da espiritualidade que Einstein teria sido Demócrito, o pai da atomística. Veríamos assim uma continuidade lógica de um trabalho, ou as diferentes personalidades de uma individualidade em evolução. O fato de Einstein na sua juventude não usar barba, bigode, ter outra apresentação física e uma compreensão menos profunda da ciência, não o torna outro indivíduo. O mesmo poderíamos considerar analogamente, quando, alguns séculos atrás, ele teria se chamado Demócrito e vivido na Grécia.

“Nascer em outra pessoa” é uma expressão corriqueira utilizada pelos que não compreendem a reencarnação. Na verdade, a essência continua a mesma – apenas troca-se a vestimenta. Brancos ou pretos, gregos ou brasileiros são exteriorizações transitórias e perecíveis que não alteram a consciência que renasce em busca do aperfeiçoamento progressivo.

Com relação a sua identificação no plano espiritual, após a morte biológica, os espíritos nos esclarecem que assumem a personalidade com a qual melhor se sentem, ou fazem jus ao seu grau evolutivo, geralmente coincidindo com a última reencarnação terrena.

No mundo espiritual, a textura do corpo espiritual, cujas unidades estruturais são moldáveis pela mente do espírito, costuma assumir a configuração com a qual ele pode ser reconhecido por nós, tal qual trocamos o macacão do trabalho pela fatiota dominical ao nos locomovermos do trabalho para as solenidades nos fins de semana.

Fundamental é que, claramente, se tenha delineado na mente uma sequência evolutiva. Renascemos para progredir. As mudanças temporárias apenas acrescentam novos ingredientes na formação da massa do bolo que constitui nossa individualidade.

Close Menu